A Pitty é mesmo foda!

10/03/2010 14:21

 

Pitty sempre teve uma personalidade única e desbocada. Nessa entrevista exclusiva ao jornalista Gustavo Godinho, a moça não fez diferente e provou que personalidade e atitude são traços marcantes de sua carreira.

 

 

Dona de um sex-appeal indiscutível e de opiniões pra lá de polêmicas, Pitty conseguiu provar sua maturidade sonora e consolidar de vez a sua carreira com o lançamento do seu novo trabalho, intitulado Chiaroscuro. Com influências de outros estilos musicais –como o bolero, por exemplo –, o disco já é um dos mais tocados e o primeiro single, Me Adora está entre as trinta canções mais executadas em todas as rádios brasileiras.

 

 

Ela respondeu questões polêmicas ligadas ao mercado fonográfico, aos seus fãs, a atual cena nacional do rock e as novas disposições de mídias que são encontradas hoje em dia no mercado fonográfico. (Publicado originalmente na revista SUCESSO!, por Gustavo Godinho)

Gustavo – Seis anos após se firmar no mainstream da música nacional, você já lançou quatro CDs e quatro DVDs. É uma média alta para tempos de crise no mercado fonográfico. Mesmo assim, seus produtos têm boas médias de vendas. A que você credita isso, já que sua base de fã é principalmente composta de jovens (justamente o tipo de consumidor que não é acostumado a comprar discos)?

Pitty – Não sei bem, pode ser que as pessoas que gostam do meu som curtam comprar discos e tenham uma certa consciência nesse sentido. Não tenho uma teoria consolidada de por quê isso acontece. Mas eu acho ótimo, do contrário seria cada vez mais difícil lançar discos e trazer novidades.

Gustavo – Sua consagração artística aconteceu quando você se baseou em São Paulo. Você acredita que para uma banda de rock se firmar em nível nacional, é providencial se fixar e fazer nome na capital paulista?

Pitty – Claro que estar perto do eixo Rio-São Paulo facilita o acesso aos meios de comunicação a nível nacional, e a minha escolha tem a ver não só com isso mas também por me identificar com a cidade. Eu morava no Rio e poderia ter continuado lá, por exemplo. Para a turnê isso também é interessante porque você está numa região mais central geograficamente falando. No meu caso morar no Nordeste implicaria num custo muito maior. Mas existem bandas que não estão em Sampa ou Rio e conseguem conciliar as coisas. Minas, Porto Alegre, Brasília. Bem, de alguma forma ainda assim é mais central do que Norte ou Nordeste.

Gustavo – Além das mídias físicas, sua carreira tem um histórico interessante de parceria com empresas de telefonia celular. Para você, qual a importância de atingir as mídias digitais de maneira abrangente?

Pitty – Importância total, é fazer parte de uma realidade de agora. Essa mídia digital existe, é incrivelmente forte e atinge muitas pessoas. E fico feliz por me sentir inserida nessa espécie de “futuro”. Imagine, há alguns anos ninguém imaginaria que um aparelho de telefone se tornaria um meio de ouvir música. Sempre procuro ter idéias novas com relação a como interagir com esse mercado, e tento ser saber que modificações e novidades estão acontecendo. E as mudanças tem sido cada vez mais rápidas.

Gustavo – No refrão de Me Adora, você solta a frase “Que você me adora, que me acha foda”. O palavrão nessa estrofe destoa da maioria das letras feitas pelas bandas atualmente, que chegam a ser bem caretas. Sua intenção era causar discussão com essa expressão ou você a considera tão banal que não imaginava que pudesse incomodar nem mesmo o fã mais puritano?

Pitty – Eu, os meus e 90% das pessoas da minha geração consideramos que é banal e ainda assim eu sabia que haveria discussão. Não havia necessariamente uma intenção, mas eu sabia que ela viria e a meu ver é uma discussão positiva. Palavrão é um recurso de linguagem como tantos outros, e a língua muda. Palavras assumem novos significados, novas expressões surgem. No caso do “foda” há muito deixou de ser ofensivo para se tornar apenas um adjetivo, sinônimo de “incrível”, “bom”, “maravilhoso”. Na verdade ela é um superlativo desses adjetivos.

Gustavo – A parceria com a banda 30 Seconds to Mars na música The Kill ajudou de alguma maneira a projetar seu nome no mercado internacional? Se não, esse ainda é um sonho que você tem? Pensa em gravar um disco apenas em inglês para tentar essa expansão?

Pitty – Algumas pessoas de lá ficaram curiosas a respeito do nosso som e do rock brasileiro, isso já é um ponto positivo. Penso em expandir as fronteiras da minha música não como um sonho, mas como uma necessidade. Chega uma hora que bate a sensação de já ter feito tudo dentro de um determinado espaço, de já ter galgado uns degraus e dá vontade de conquistar coisas novas. É natural. Um caminho seria sem dúvida ter material em inglês, e já pensei nisso. Só não sei ainda quando vou executar.

Gustavo – Seu novo disco Chiaroscuro é considerado o mais maduro de sua carreira. Influências de bolero e flamenco são notadas. Além do nome, que é uma referência à uma técnica Da Vinci. Você não acha que seu público ainda é imaturo para entender todas essas informações?

Pitty – Não me interessa se ele é maturo ou imaturo. Arte é forma de expressão, não uma encomenda. E o artista usa a arte para isso, pra se expressar, pra se comunicar, pra expor pensamentos e sentimentos pessoais mesmo que a respeito do mundo ao redor. Não dá pra fazer música subestimando e nem superestimando as pessoas, as pessoas vêm depois que a obra já surgiu. E pelo feedback que eu tive, nem acredito que esse público seja tão imaturo assim, muitos sabem a que me refiro. Mesmo os que não entendem, de todo modo podem encontrar ali um estímulo para pesquisar, se informar, aprender coisas novas. Eles são curiosos, correm atrás da informação.

Gustavo – Hoje em dia tem aparecido uma leva de bandas que abusam da inluência de elementos eletrônicos nas melodias e mesmo assim se denominam de rock. O que você acha disso?

Pitty – Música boa é música boa com elementos eletrônicos, acústicos, psicodélicos ou percussivos. E acho que o rock pode dialogar com diversas linguagens diferentes e continuar sendo rock. O que faz algo ser rock pra mim vai além disso e tem mais a ver com essência. Ou seja: vejo pouquíssimas bandas que podem ser consideradas rock no mainstream, mesmo que entupidas de guitarras distorcidas.

Gustavo – Recentemente você lançou um game para celular que leva o mesmo nome de seu novo disco. Fale sobre isso.

Pitty – É mais uma possibilidade que se abre nessa coisa de linkar música e novas tecnologias. Os joguinhos são temáticos e cada um deles tem a ver com uma música do disco. Ficou muito interessante o resultado, e as pessoas adoraram.

Gustavo – Hoje em dia os teus fãs que acompanham sua carreira desde o começo já estão adultos. No que você tem focado sua carreira: na renovação do público (focando mais a molecada) ou no amadurecimento em conjunto com seu público?

Pitty – Eu foco e sempre tentarei focar minha carreira no fato de fazer música que me represente. Música que vem de dentro, letras que são quase confissões profundas e minha visão de mundo. Preciso que seja assim pra me expressar, pra me realizar. As pessoas que vão acompanhar isso e frequentar os shows ou comprar os discos, tem de ser gente que se identifique. É de dentro pra fora, entende? E o que acontece, espontâneamente, é um amadurecimento em conjunto entre banda e público. Tem que ser real, eu não vou fazer música que não sou eu apenas para “renovar o público” nem tampouco para “adquirir ouvintes mais velhos”. Eu vou fazer, ponto. E quem vier junto virá porque sente as mesmas coisas que eu.

Gustavo – Você sofreu algum tipo de preconceito por namorar Daniel Wesckler, que é mais novo que você? Você é fã de emocore?

Pitty – Se aconteceu, eu nem reparei. Nem gasto meu tempo com gente preconceituosa. Não sou fã de emocore, e as pessoas se equivocam imensamente quando rotulam a banda dele assim.

Gustavo – Hoje em dia as bandas de rock nacional apostam em letras comportadas. Você acha que isso fez com que o estilo perdesse a graça? Na década de 90 tínhamos as boas bandas Raimundos e Planet Hemp. Hoje em dia temos Strike e Fresno. Você acha que esse “jeito comportado” tira a graça do rock?

Pitty – Acho. Inclusive me sinto bem orfã nesse cenário, muito por causa disso. Tá tudo tão limpinho, arrumadinho, certinho, simpatiquinho que até dá agonia. O mundo precisa de anti-heróis pra sacudir as coisas de vez em quando, do contrário nada muda.